Jardim José do Canto


Um Jardim no coração de Ponta Delgada



As terras em que foi plantado por José do Canto, em Ponta Delgada, o Jardim Botânico, que tem o seu nome, pertenceram à sua mulher, D. Maria Guilhermina Taveira de Neiva Frias Brum da Silveira, 12?Senhora da Casa e Morgado dos Bruns, e estavam integradas em dois dos principais vínculos de que foi a última administradora: o de Diogo Vaz Carreiro e o do Licenciado António de Frias. Pertencem, assim, à mesma família, há vinte gerações.





O primeiro proprietário das terras (ou de parte delas) terá sido um povoador vindo para S. Miguel no séc. XV, Gonçalo Vaz Carreiro. Segundo Gaspar Frutuoso a sua saída do continente ficou a dever-se a uma eterna causa de complicações: uma questão sentimental. Escreve o Cronista: "Havia-se casado este Gonçalo Vaz, contra vontade de seus pais, com Isabel Cabeceiras, (moça tão formosa, que se falou em sua formosura mêsa de El-Rei D. João II; e pela razão daqueles males e a conselho do sogro, veio então a esta Ilha, recebendo do Capitão todas as terras, tantas e tão importantes que se afirmou rendiam cada ano mais de dois mil moios de trigo, que êle por sua vez espalhava em dádivas por outros colonos e vizinhos que conhecia, consolidando assim fidalgamente a situação privilegiada que desfrutava."

D. Maria Guilhermina herdou a casa dos Bruns com poucos anos. A época era turbulenta... a fortuna enorme... desenfreadas as cobiças de parentes... Compreende-se bem a urgência da Mãe em vêla casada. O casamento com José do Canto veio a realizar-se em 17 de Agosto de 1842, tendo ele 22 anos de idade e ela apenas 15. Assim as velhas terras dos Carreiros-Frias-Bruns passaram a ser administradas por José do Canto que iria influenciar profundamente o seu destino.
Tendo grande interesse pela botânica, entra, desde logo nessa "competição" que, na época se desenrolava em S. Miguel quanto à implantação de Jardins Botânicos.
Ainda nos anos de 1840, encomenda em Londres o projecto do Parque e de um Palácio, a David Mocatta (1806-1882), homem considerado, na época, de muito bom gosto e influenciado pelos seus longos anos de estudo em Itália. O projecto tem a data de 1845 e José do Canto pagou por ele um preço que considerou “exorbitante? Note-se que os arruamentos do Jardim mantêm até hoje, na sua maioria a traça do projecto inicial.
Durante cinquenta anos, vivendo em Paris ou em S. Miguel, Jos?é do Canto adquiriu permanentemente espécies para o Jardim, contactando os maiores viveiros da época pessoalmente ou por carta. As suas cartas fazem referências constantes a aquisições; parques botânicos visitados ou contactados por carta; viveiristas comerciantes e fornecedores das espécies adquiridas, (numa carta refere um lote que, encontrando-se pronto a ser expedido do jardim de Argel para S. Miguel... foi comido por uma praga de gafanhotos...) preços; transporte das compras para a Ilha, (instruções a agências e até a comandantes de navios) etc., etc.   
A contínua expansão do parque e o seu enriquecimento botânico durou mais de metade do século XIX. Dos anos 40 (o projecto está pronto em 1845/46), até 1898 (ano da morte de José do Canto). Terá chegado a conter cerca de 6000 espécies. A sua riqueza botânica está documentada pelo catálogo, que Jos?é do Canto elaborou pelo seu próprio punho, e ao qual deu o nome de “Enumeração das Principais Plantas Existentes no meu Jardim de Sta. Anna, na primavera de 1856: ordenada por José do Canto. Seu irmão, Ernesto do Canto, deixou no manuscrito, a nota seguinte: “Contem 1028 géneros e aproximadamente 6000 espécies? Como do mesmo documento se pode ver, José do Canto actualizou-o, subsequentemente, com referências a compras posteriores e algumas indicações sobre “o destino de plantas e/ou sementes: (“morreu em..., “nasceu" etc.). O catálogo contém ainda, em alguns casos, indicações sobre as entidades às quais as plantas e/ou sementes haviam sido adquiridas.
O Dr. Edmond Goeze, Director do Jardim Botânico de Coimbra, deslocou-se a S. Miguel em 1866. Ao chegar a Coimbra e perante a relativa pobreza do Jardim Universitário, Goeze, (que teria já vindo para Portugal na sequência de contactos com José do Canto), resolveu recorrer aos grandes coleccionadores de S. Miguel e aos respectivos “jardins de aclimatação" interessantíssimo o relato da sua viagem publicado sob o título “A Ilha de S. Miguel e o Jardim Botânico de Coimbra? Coimbra, Imprensa da Universidade, 1867. O seu entusiasmo pelas colecções botânicas transparece bem em múltiplas passagens do trabalho. Escreve, por exemplo: “Faltam-nos expressões que possam bem significar as sensações agradáveis, e a admiração profunda que sentimos visitando pela primeira vez os jardins dos Srs. José do Canto e António Borges da Câmara... (pág. 9). “O jardim do Sr. José do Canto inquestionavelmente o mais rico de todos. Nenhum dos jardins particulares, que tivemos ocasião de visitar na Europa, lhe pode ser comparado (...)(pg. 42).
Aqui recebeu Goeze inestimáveis apoios, levando para Coimbra perto de mil espécies das quais, segundo escreveu, 800 provenientes do Jardim José do Canto, que assim, constituiu a verdadeira fonte da reconstituição do Jardim Universitário. Goeze foi, depois, (1873) contratado para trabalhar no Jardim Botânico da Escola Politécnica de Lisboa e o Jardim José do Canto foi, de novo, um dos parques que “mais contribuíram para o novo Jardim.

Durante décadas diversos jardineiros estrangeiros, julga-se que todos ingleses, trabalharam no Jardim. O primeiro parece ter sido George Brown (1812-1880) que já estava em S. Miguel em 1861. O principal foi, depois, Alexander Reith. (uma filha de George Brown, Sophia, deixou a receita de um célebre bolo inglês, que ainda hoje é feito no Jardim José do Canto.
Em 1937, nas partilhas ocorridas por morte de D. Margrida Brum do Canto Hintze Ribeiro (filha de José do Canto), o Jardim é dividido em duas fracções de tamanho desigual. Um socalco correspondente à extrema norte da propriedade, com área relativamente pequena, mas onde se encontra implantada a chamada casa do “Calço da M"Cara" cabe a António Brum do Canto Hintze Ribeiro (filho de D. Margarida). Todo o resto do Jardim, apenas com as ruínas das casas de Diogo Vaz Carreiro, cabe a D. Maria da Graça (neta de D. Margarida), casada em 1938 com Augusto de Athayde.
A propriedade pertence hoje aos descendentes deste casal.

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